Black Dog
Dave McKean: Música e arte eram minhas duas paixões quando criança. E essa foi minha escolha. Eu tinha, profissionalmente, que optar pelo caminho da arte ou da música. Eu sentia isso. Então fui para a escola de artes, porque isso parecia a coisa certa para fazer, mas eu sempre senti falta da música. Então, tem sido fantástico poder fazer essas duas coisas se encontrarem em projetos como Black Dog. Meu quadrinhos favoritos soam como música. Eles não são preenchidos com muito texto. Eles são, preferencialmente, sem texto. O importante é que a narrativa e as imagens fluam como música. Elas têm essa liberdade.
E a música que eu escrevo tende a possuir um elemento narrativo. Eu não sou muito bom em escrever melodias que não tenham uma razão. Ela tem que – de alguma forma – estar contando uma história. Então, música e narrativa são muito importantes para mim. Por algum motivo, a narrativa é algo muito fora de moda no mundo das artes hoje em dia. Enquanto que, para mim, ela é um elemento crucial para nossa cultura. É como transmitimos para as novas gerações a maneira pela qual nos percebemos como seres humanos.
Raio Laser: Seu trabalho sempre teve um aspecto de bricolagem, de colagem de vários elementos. Em determinado instante, a presença da manipulação digital surge em sua obra. Como vê isso hoje? Haveria uma sensação de que alguma coisa ficou datada ou o trabalho anterior funciona como uma espécie de marca daquele tempo? Como enxerga o trabalho anterior em retrospecto?
Dave McKean: Bem, eu comecei tentando fazer imagens que fossem translúcidas e com aspecto onírico, mas utilizando meios físicos, como fotografia, múltiplas chapas fotográficas, colagem física de objetos. Eu consigo obter cerca de 20% daquilo que estava imaginando na prancha (de desenho). Mas então eu comprei um computador e li o manual do Photoshop. E foi como se alguém o tivesse escrito para mim! Era exatamente o que eu queria fazer. E eles conseguiram alcançar esse resultado da mesma maneira que eu teria feito. Então eu senti que o Photoshop tinha sido feito para mim. Um mês depois de começar a usar ferramentas digitais, eu comecei a obter de 50 a 70% – do que eu estava imaginando – no produto final. Eu adorei o controle e a manipulação que ele me deu sobre as imagens. Além disso, tinha o fato de que você podia testar coisas muito rapidamente, salvar as versões preferidas... Era como se estivesse brincado. Eu achei a experiência muito divertida. Mas o que acontece é que comecei a ver muitas outras pessoas utilizando ferramentas digitais. E eu também fiz muitos trabalhos usando Photoshop por muitos anos. Bem, eu tive prazer em brincar com essas ferramentas, mas eu sinto muita falta da humanidade presente numa imagem desenhada ou pintada em meio físico. Eu ainda uso Photoshop o tempo todo, mas é apenas para controlar a imagem no final do trabalho. E a imagem e a pintura são feitas por meio físico. E se, eventualmente, uma página ou parte específica da história requer uma experiência digital estranha ou algo do tipo, então eu uso (o Photoshop), mas é apenas uma ferramenta com muitos truques. Não é a coisa mais importante. Não é ele quem dá as cartas.